quarta-feira, 22 de abril de 2009

NOTA À SOCIEDADE BRASILEIRA

A ABRAÇO, Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária, entidade máxima de representação das rádios comunitárias no Brasil, vem a público externar sua indignação sobre a ação midiática promovida pela Anatel, Polícia Federal, Polícia Civil e Prefeitura de São Paulo, orquestrada pelos setores inimigos das rádios comunitárias, sobre a ação que destruiu 8 toneladas de equipamentos de rádios no último dia 08 de Abril no Aeroporto de Congonhas em São Paulo, ato esse que vem fortalecer a versão mentirosa de que “Rádio comunitária derruba avião”. Entendemos que, com a convocação da Conferencia Nacional de Comunicação, o setores conservadores da mídia brasileira utilizará de todos os seus meios para ganharem a opinião pública para a sua versão de democratização da comunicação e a liberdade de expressão e a Anatel vem demonstrar explicitamente de que lado está.
Nossa indignação se mostra a partir dos assuntos abaixo relacionados;
1 – A Anatel alega em sua nota pública que os equipamentos destruídos estavam com seus processos concluídos junto a Justiça Federal e que todos os equipamentos eram transmissores de rádio sem certificação e poderiam interferir nos sistemas de navegação aérea.
MENTIRA – Além de equipamentos de transmissão propriamente dito, foram destruídos aparelhos de som, mixer, cds originais, compressores de áudio, microfones e demais equipamentos ilegalmente apreendidos que não poderiam ser qualificados como equipamentos que poderiam causar radiointerferência nos serviços de navegação aeronáutica. Além disso, foram destruídos também equipamentos certificados e homologados pela própria Anatel, se estes equipamentos poderiam interferir nos sistemas de navegação aeronáutica, a culpa por estas transmissões seriam da própria agência reguladora que homologa equipamentos de péssima qualidade técnica sem observar as normas técnicas legais.
2- A Anatel justifica sua ação com base em decisão judicial. Nossa pergunta é: Quem provocou o poder judiciário para que esta ação fosse determinada? Porque não foi oferecido as entidades de representação das Rádios Comunitárias o direito legítimo do contraditório no referido processo judicial? Porque a ANATEL divulgou a destruição dos equipamentos no mesmo dia de sua destruição, impedindo as entidades de representação das Rádios Comunitárias contestar a referida decisão judicial para se evitar a destruição destes equipamentos que são poupanças populares adquiridas com muito suor pelas comunidades carentes?
3 – Porque a ANATEL não procurou as emissoras comunitárias legalizadas para fazer a doação destes equipamentos, já que na legislação não é permitido que as rádios comunitárias possuam uma política de sustentabilidade que faça com que as rádios comunitárias possam comprar equipamentos para assim garantir sua sobrevivência?
4 – Porque somente a grande mídia monopolizada foi convidada para fazer matérias jornalísticas sobre a destruição dos equipamentos e não a mídia popular que possui posição contrária a mais esta barbárie. Será que a ANATEL assim como o monopólio da comunicação tem o mesmo interesse de criminalizar um movimento legítimo, filhos das lutas populares?
5 – Existem no Brasil, milhares de grupos culturais espalhados nas vilas e pequenas localidades do interior que não possuem equipamentos para produzir suas produções culturais, e estes equipamentos, construído na luta e suor de milhares de trabalhadores não poderiam ser doados para estes grupos culturais no intuito de preservar e valorizar sua cultura local, ou será que a ANATEL assim como o monopólio da comunicação também defende a descaracterização de nossa cultura popular?
6 – Porque será que a ANATEL age como um leão para as rádios comunitárias e um gatinho para as rádios dos poderosos e não age da mesma maneira, destruindo os equipamentos das rádios comerciais que provocaram interferência no Aeroporto de Viracopos em Campinas e na cidade de Bom despacho em Minas Gerais , interferências estas causadas pela Rádio Clube de Itu e pela Rede Globo de Televisão?
A ABRAÇO entende que a maioria das rádios comunitárias que são apreendidas pela força do estado brasileiro são legitimadas pela inoperância do Ministério das Comunicações, que atualmente conta com apenas 16 funcionários para atender a demanda de mais de 20.000 processos que atualmente mofam no Departamento de Comunicação Eletrônica do Ministério das Comunicações, privilegiando com outorgas de seus apadrinhados políticos.
Segundo pesquisa do Prof da UNB Venício Lima, 50,2% das Rádios Comunitárias autorizadas no Brasil possui políticos como proprietários, mas entendemos que esta situação não se alterará se não criarmos imediatamente um Conselho de Acompanhamento de Processos, com a participação de representantes da sociedade na fiscalização dos atos de outorga, para se evitar este Câncer, que corrói a sociedade brasileira. Entendemos que este problema não é de responsabilidade das Rádios Comunitárias, mas sim dos políticos que atuam de forma contrária aos interesses da democracia.
A Abraço não poupará esforços para a abertura de uma sindicância interna para apurar a ligação de parlamentares e o Ministro das Comunicações para a apuração destas concessões, e reivindica imediatamente a revogação de todas estas outorgas concedidas ilegalmente.
Também desde já nos iremos interpelar judicialmente a ANATEL e seu gerente Regional de São Paulo, Everaldo Gomes Ferreira contra mais um ato criminoso contra a democracia neste país.
Mais uma vez a Abraço se coloca na luta por justiça neste país, e convoca a sociedade brasileira e as rádios comunitárias instaladas neste país, com ou sem outorga a se manterem no ar, para garantimos a liberdade de expressão neste país.

OUSAR, RESISTIR, TRANSMITIR SEMPRE.
RÁDIO COMUNITÁRIA, A VERDADEIRA RÁDIO PÚBLICA.



Executiva Nacional

CONTATOS:
abraconacional@yahoo.com.br
josesoter@yahoo.com.br
jerry.alexandrede@hotmail.com


quinta-feira, 9 de abril de 2009

Cirineu fedriz - Coordenador da Abraço SP relata curso da ANATEL para juízes

Gente, por incrível que parece, em uma conversa informal com um professor do meu curso (direito), que é juiz federal daqui de Bauru, sobre rádio comunitária, onde discutimos alguns pontos, e por ser meu professor fiquei bem a vontade para expor algumas questões sobre o tema fiquei sabendo o seguinte:
Fiquei surpreso quando ele me disse que a Anatel tem ministrado cursos aos juízes sobre esse tema, e no curso só falam asneiras que já conhecemos, que os magistrado não podem dar liminar, porque derrubam aviões e etc...
No meu humilde entendimento, talvez Santin, Joaquim e Clementino podem nos auxiliar melhor pela vasta experiência jurídica que possuem, é que cerceiam o direito de defesa, culminando por decisões que pesam só um argumento por culpa desses cursos da Anatel. E até mesmo a respeito da soberania da justiça, a qual não deve sofrer interferência estatal. Imaginamos os juízes sendo orientados pelo inss, receita federal entre outros órgãos para decidirem só a favor deles mesmos. Se cria uma grande incerteza jurídica e a justiça perderá sua principal função é que é de apaziguar e decidir sobre os conflitos existentes na sociedade.
Diante disso, mostra que essa autarquia não está pra brincadeira, e devemos agir, e rápido.
Segue também em anexo, um comunicado interno da Polícia Federal, que não sei porque (não foi eu quem anexou, e sim a própria pf no inquérito), estava anexada em um dos meus 8 (oito) processos que possuo. Interessante dar uma lida, é um puxão de orelha dos superiores sobre os excessos nas prisões dos integrantes das radcons.
Vamos agir gente, fiquei revoltado com as imagens da destruição dos equipamentos feito pela anatel, dava a entender que se tratavam de cd´s piratas,,,, (coincidência não?)

Boa Páscoa a todos

Cirineu

Destruição de equipamentos pela Anatel lembra período sombrio da história do País

A destruição dos equipamentos apreendidos das rádios comunitárias em São Paulo, na última quarta-feira (8), numa ação promovida pela Anatel, tem um significado atemorizante, que relembra períodos sombrios da história do País, quando instrumentos de cultura, equipamentos de inteligência foram destruídos por agentes políticos medíocres e violentos.
A Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária (Abraço) considera o ato criminoso e estuda, com o seu departamento jurídico, quais são as ações cabíveis no momento. Se necessário, apelará para as vias judiciais. Ouça as manifestações do jornalista Celso Schröder, Coordenador-Geral do FNDC, e de José Sóter, Coordenador Executivo da Abraço nacional.

Nota oficial da FRENAVATEC sober as ações criminosas da ANATEL

A FRENAVATEC - Frente Nacional pela Valorização das TVs Comunitárias está solidária com os dirigentes de Rádios Comunitários que tiveram este ato de vandalismo praticado pela ANATEL, justamente um órgão público que deveria estar servindo aos interesses do seu patrão, ou seja: o povo. A que interesses a ANATEL estará servindo?

No momento em que estamos lutando pela realização de um MARCO REGULATÓRIO e das NORMAS pertinentes para o setor, com a realização da CONFERÊNCIA NACIONAL DA COMUNICAÇÃO, vem a ANATEL em um ato transloucado e coloca em risco a fé e a crença dos radiodifusores comunitários no Governo Federal.

Cobramos do Presidente Lula, da Ministra Dilma Rousseff, do Ministro Hélio Costa uma resposta imediata e sensata para este gesto de banditismo que não pode perpetuar no seio de uma agencia reguladora que se comporta como dona da verdade, acima da lei e dos poderes constituidos. É necessário que haja uma resposta imediata e uma punição severa.

A ANATEL, errou feio ao destruir inúmeros equipamentos pertencentes ao povo brasileiro, tornando-se o CARRASCO da atualidade, numa demonstração exacerbada de mandonismo, comportando-se como algozes de uma classe trabalhadora, honesta e necessária para a real democratização da comunicação neste país.

Jéfferson Mello
FRENAVATEC - Frente Nacional pela Valorização das TVs Comunitárias

Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação


Nota Oficial

FNDC condena vandalismo da Anatel

A destruição de equipamentos de rádios comunitárias constitui um ato de ignorância e prepotência, representa uma atitude deliberada contra a democratização da comunicação e deixas às claras os temores de setores empresariais frente à Conferência Nacional de Comunicação

1) A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) destruiu dia 8 de abril, em São Paulo, oito toneladas de equipamentos apreendidos de radiodifusores comunitários.

2) A destruição, fartamente documentada e divulgada pela própria Anatel, foi feita com máquinas do município cedidas pelo prefeito Gilberto Kassab (DEM), e por ele acompanhada.

3) A Agência justificou sua atitude definindo-a como um “ato simbólico”, sinalizando a disposição das autoridades de combater “atividades ilegais”.

4) O Fórum Nacional pela Democratização (FNDC), entidade integrada por centenas de entidades municipais, regionais e nacionais, através da sua Coordenação Executiva condena com veemência a atitude da Anatel.

5) Ao lado das suas atribuições regulatórias gerais, cabe à Anatel também trabalhar pelo fomento da radiodifusão comunitária, considerando a sua reconhecida importância para a sociedade.

6) Entretanto, a Anatel atua de modo contrário à democracia.

7) Ao destruir os equipamentos a Agência pratica um ato de vandalismo, investindo contra um patrimônio coletivo e de inestimável valor social para as comunidades.

8) Ao destruí-los, a Anatel age de modo prepotente, pois lhe caberia a guarda do material e as providências para a sua preservação e reutilização, considerando que está em curso o aperfeiçoamento da legislação vigente e a regularização de milhares de emissoras comunitárias, cujos processos aguardam despachos do Governo Federal.

9) A destruição dos equipamentos também representa uma cabal demonstração de ignorância sobre o papel fundamental da comunicação para a consolidação da democracia, o fortalecimento da sua pluralidade e dos laços culturais da nação brasileira.

10) A desabusada prática de vandalismo, prepotência e ignorância perpetrada pela Anatel não se deve a qualquer eventual desvio das suas funções, mas sinaliza que aquela Agência e os interesses dos grandes grupos de comunicações nela abrigados movem-se contra a realização da 1ª Conferência Nacional de Comunicação, prevista para dezembro deste ano.

11) O FNDC reconhece a importância dos grandes meios de comunicação e historicamente defende a regulamentação das comunicações brasileiras, assim como defende enfaticamente o direito das comunidades praticarem a sua própria comunicação e nela se reconhecerem.

12) O gesto da Anatel, apresentado como “simbólico”, efetivamente tornou-se símbolo de práticas e idéias destinadas à lata de lixo da história.

13) Essa evidência, porém, não exime a Anatel de prestar contas ao povo brasileiro pelos acontecimentos de São Paulo, sob pena de fazê-lo através de uma ação judicial, que já está sendo avaliada pelas entidades pró-democratização da comunicação de todo o país.

14) O FNDC está e sempre estará ao lado daqueles que são perseguidos e silenciados pelos interesses antidemocráticos e convoca os brasileiros e brasileiras que lutam pela democracia na comunicação para se unirem em defesa da Conferência Nacional de Comunicação.

Brasília, 9 de abril de 2009.

Entidades Coordenadoras-executivas do
Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação - FNDC

ABRAÇO – Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária
ANEATE – Associação Nacional das Entidades de Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões
CFP – Conselho Federal de Psicologia
FENAJ – Federação Nacional dos Jornalistas
FITERT – Federação Interestadual dos Trabalhadores em Empresas de Radiodifusão e Televisão
Secretaria Executivawww.fndc.org.br(51) 3213-4020 r.217

segunda-feira, 9 de março de 2009

Rádios comunitárias. Um canal no dial é um bem escasso

06/03/2009

Redação

IHU Online

Entrevista Especial com Teresa Cristina Matos

Dedicada à pesquisa sobre a temática radiofônica, em especial ao estudo das rádios comunitárias no Brasil, Teresa Cristina Matos defende a regulamentação das rádios comunitárias e diz que não há espaço para todos no dial. Para ela, o projeto de Lei 4573/2009, proposto pelo governo para descriminalizar as rádios comunitárias, além de ser resultado de mobilizações pelo reconhecimento do direito à comunicação não-comercial e não estatal, “aponta uma mudança de orientação importante no tratamento dado das rádios sem licença”. De acordo com o texto encaminhado ao Congresso, algumas medidas de controle ainda permanecem e as rádios que atuarem sem permissão continuarão caracterizadas como ilícitas.
Na entrevista que segue, concedida por e-mail à IHU On-Line, a pesquisadora enfatiza que toda a radiofonia no Brasil se submete a mecanismos de controle, e isso não viola os princípios democráticos. “Considerando o fato de que o dial é limitado e que o serviço deve preservar princípios democráticos e estar a serviço das comunidades, evitando o proselitismo político e religioso, seria ingenuidade pensar a ausência de mecanismos de controle.”
A professora de Ciências Sociais da Universidade Federal da Paraíba ainda explica a confusão gerada através do uso de termos como “piratas” para designar emissoras ilegais ou comunitárias. Essas emissoras vivem hoje um cenário de conflito, e os confrontos, esclarece, se devem a disputa por “um bem escasso, um canal no dial”, o que garante para as emissoras a classificação de rádio comunitária, ou seja, o reconhecimento de atuar de forma legalizada.
Teresa Cristina Matos é graduada em Ciências Sociais, pela Universidade Estadual do Ceará (UECE), mestre em Sociologia, pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal da Paraíba, com a dissertação Rádios comunitárias: memória e dádiva, e doutora em Sociologia, pela Universidade Federal do Ceará, onde produziu a tese intitulada Rádios comunitárias: sintonia dissonante e “autoimagem”.

Confira a entrevista.
IHU On-Line – Como a senhora percebe a descriminalização das rádios comunitárias no Brasil?
Teresa Cristina Matos – É preciso retirar as questões referentes à radiodifusão comunitária da esfera policial e criminal para a esfera civil e administrativa. Entendo que o Projeto de Lei 4573/2009, que descriminaliza a radiodifusão sem licença (e dentro dessa definição enquadram-se principalmente rádios comunitárias), é, em grande medida, resultado de um longo processo de mobilização pelo reconhecimento do direito à comunicação não-comercial e não estatal. Do ponto de vista histórico, o processo acompanha a vida política brasileira recente, em que a busca por democratização colocou-se como uma das questões centrais durante o período da Ditadura Militar e no momento imediatamente posterior de redemocratização.A forte mobilização de ativistas que colocaram a questão do direito a comunicação comunitária como prioritária nos anos 1990 iniciou o deslocamento do problema, colocando-o como uma questão política importante e não como uma questão policial. Por outro lado, essa mudança refletiu a efetiva realização de experiências em torno da radiodifusão não-comercial e não-estatal, naquele momento definidas por termos diversos como “popular”, “livre”, “comunitária” e “pirata” (o termo era usado então dentro do próprio movimento com um sentido de afirmação política de uma forma de comunicação libertária e transgressora).
Exemplos da experiência comunitária
Vários estados brasileiros registravam experiências bem-sucedidas de radiofonia comunitária. Em muitos casos, eram usados alto-falantes para a difusão dos programas (São Paulo e Fortaleza, registraram esses experimentos), em outros, o uso do dial dos rádios marcou o aparecimento de algumas emissoras, sendo uma das mais conhecidas a Rádio Favela, de Belo Horizonte, hoje funcionando com outorga de canal educativo. O Brasil era, até então, um dos poucos países que não haviam reconhecido o direito a radiodifusão comunitária. A Lei 9612 de 1998 tornou o serviço uma possibilidade legal, mas trouxe consigo um pacote de regulamentações muitas vezes limitantes.
É claro que dentro do ambiente de defesa de interesses, que marcou o processo de aprovação do projeto de Lei que deu vida a Lei de Radiodifusão Comunitária, uma série de medidas restritivas colocaram as emissoras numa situação de fronteira muito tênue entre a legalidade e a ilegalidade. As limitações de área de cobertura e de patrocínio são bons exemplos disto. A Lei demarcou a impossibilidade de veiculação de publicidade (fator de limitação da manutenção financeira das radicom) e a limitação do serviço a um único canal localizado no final do dial. Comparando a oferta do dial para outras modalidades de radiodifusão não comunitária, a lei estabelecia uma enorme diferença de prioridade entre comerciais e comunitárias. De lá pra cá, embora a efetivação do processo de outorga tenha sido marcado por uma morosidade enorme, ele significou uma mudança de orientação significativa. A criminalização absoluta foi dando lugar a uma possibilidade de interpretação das rádios comunitárias em seu papel social, e estabelecendo uma imagem positiva das emissoras.
IHU On-Line – Podemos tratar as rádios que não são legalizadas de rádios piratas? Qual a diferença de rádios comunitárias e rádios piratas? Segundo o projeto do governo, uma das medidas é acabar com asrádios piratas. A senhora pode explicar as diferenças e por que existe tanta confusão quando se trata do assunto?
Teresa Cristina Matos – Em minha pesquisa de doutorado, ao reconstruir o tratamento dado pela imprensa às radiocom, bem como a forma como as próprias emissoras se autodenominavam, fui percebendo uma transformação no significado de alguns termos; assim como uma mudança na escolha das denominações usadas para definir o que hoje conhecemos como radiodifusão comunitária. A mudança revela transformações no próprio cenário da radiofonia, assim como na relação entre rádios comunitárias e rádios comerciais. Os termos são construções sociais e seus usos expressam as injunções do momento e as disputas que então ocorrem. Nos anos 1980, os jornais cearenses, por exemplo, designam as rádios não comerciais, não-estatais e não-educativas principalmente de “alternativas” e “populares”. O termo “pirata” poucas vezes era usado, e quando aparecia, enfatizava a ideia de rebeldia. Naquele momento, muitas das rádios alternativas e populares, como também se autodenominavam, operavam com serviço de alto-falantes. As matérias sobre elas dão ênfase a relação das rádios com as comunidades onde se inserem e o papel positivo que elas exercem. Nos anos 1990, quando da organização das rádios enquanto movimento social organizado e com uma demanda clara pelo direito a comunicação, se estabelecem basicamente duas denominações: comunitária e pirata. O termo rádio livre, também comum nos anos 1980, praticamente desaparece.
Diante do crescimento do número de rádios que se afirmam comunitárias, a Associação Brasileira de Rádio e Televisão (ABERT) lança sucessivas campanhas publicitárias. Nelas, as rádios comunitárias sem outorga são chamadas genericamente de piratas. O termo inicialmente rechaçado passa, pouco a pouco, a fazer parte do próprio repertório das radicom, sendo usado para definir fronteiras entre “rádios verdadeiramente comunitárias” e “rádios que se dizem comunitárias”. A questão da legitimação é central aqui. Durante a pesquisa, registrei depoimentos de membros de rádios, de líderes de associações de radiocom e polêmicas em fóruns de discussão em que o termo é usado, não sem tensão, para criar demarcações dentro do próprio campo das radiocom. Hoje, há um conflito no campo da radiofonia alternativa em torno da classificação “comunitária”. Em jogo, estão um modelo diferenciado de fazer rádio e o direito a outorga como canal de radiodifusão comunitária.
Identificando uma rádio comunitária
O barateamento dos equipamentos de radiodifusão fez surgir um enorme mercado para interessados em montar uma rádio. Esses interessados nem sempre têm ligações com o movimento de rádios comunitárias e em muitos casos não se identificam com um conjunto de princípios ligados as bandeiras históricas do movimento. A partir de 1998, assiste-se a multiplicação de denúncias de rádios que se afirmam como comunitárias, mas que são fachada para a ação de proselitismo político e religioso, ou ainda funcionam como pequenas rádios comerciais disfarçadas de rádios comunitárias. É para classificar esse tipo de emissora que o movimento de radiocom passa a usar a definição pirata.
Em síntese, podemos dizer que, depois da criação da Lei 9612/98, as rádios ganham maior visibilidade na imprensa e crescem rapidamente em número. Após um movimento de agregação de rádios de baixa potência, que visava unir forças para pressionar o Estado a reconhecer sua presença, como descrito acima, se configura um novo momento. Nele, toma a cena um movimento de legitimação, reconhecimento e diferenciação entre diferentes tipos de rádios que reivindicam a denominação “comunitária”. Assim, é num cenário de conflito e disputa por um bem escasso, um canal no dial, que o reconhecimento como rádio comunitária e a desqualificação como rádio pirata passam a ser armas na disputa pela possibilidade de fazer rádio legalmente dentro da rubrica comunitária.
IHU On-Line – Pode ocorrer uma mudança nesse cenário, a partir do projeto do governo encaminhado ao Congresso para descriminalizar rádios comunitárias ao acabar com a pena de prisão para quem for flagrado operando sem autorização?
Teresa Cristina Matos – Não sei se o fim da pena de prisão criaria um novo cenário. A dinâmica de aparecimento das rádios geralmente tem o seguinte movimento: primeiro a rádio é montada, começa a operar e em seguida, entra com o pedido de outorga. Enquanto o processo tramita, a rádio permanece no ar. É a fase de maior risco, já que, de acordo com a atual legislação, os responsáveis podem ser presos, processados e pagar multa. Além disso, a própria outorga corre risco caso sejam flagrados atuando sem permissão. Com a nova lei, os riscos diminuem para o responsável, mas a transmissão sem permissão permanece ilícita. E, se ela põe em risco a “segurança” de serviços públicos e de emergência, a pena de reclusão permanece. Acho que as rádios vão continuar aparecendo e buscando a outorga, com ou sem a mudança a aprovação das modificações na legislação vigente.
IHU On-Line – Segundo o projeto encaminhado ao Congresso, multas, apreensões de equipamentos e a suspensão do pedido de licença ainda serão mantidos. O que isso representa? De fato esse é um projeto que visa o fim da descriminalização das rádios comunitárias?
Teresa Cristina Matos – O projeto de lei aponta uma mudança de orientação importante no tratamento dado das rádios sem licença. Como já foi dito, a pessoa que coloca a rádio no ar não poderá mais ser presa ou julgada. Entretanto, o projeto mantém a ideia de que a transmissão sem autorização é ilícita. Considerando o fato de que o dial é limitado e que o serviço deve preservar princípios democráticos e estar a serviço das comunidades, evitando o proselitismo político e religioso, seria ingenuidade pensar a ausência de mecanismos de controle. Entretanto, nos 11 anos que marcam a criação da lei de radiodifusão comunitária, vários aperfeiçoamentos ocorreram. Os melhoramentos são fruto de uma enorme pressão e mobilização que o movimento de radiocom fez, usando estratégias eficientes como a articulação de parlamentares simpáticos a causa para a revisão das leis ou para forçar a criação de mecanismos para dar agilidade aos processos de outorga. A criação de Grupos de Trabalhos para pensar mecanismos, a fim de tornar menos morosos os processos de outorga, é um bom exemplo disso.Muita coisa, é claro, pode ser melhorada. Olhando o dial brasileiro, percebe-se um claro predomínio das emissoras comerciais. Há uma ou outra emissora educativa e um ou dois canais para abarcar todas as rádios comunitárias. Não é difícil perceber que há pouco espaço para a comunicação comunitária. Outro ponto bastante delicado é o do financiamento radiocom. O modelo de apoio cultural é muito limitante para a captação de recursos, o que torna a sustentação financeira dessas emissoras precária e incerta. Considero que essa será uma das questões a ser revista a médio prazo. O atual Projeto de Lei em tramitação qualifica a veiculação de publicidade como infração, mantendo o modelo já em vigor.
IHU On-Line – A Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e TV (ABERT) disse que o projeto incentiva rádios piratas. Isso tem fundamento?
Teresa Cristina Matos – Não vejo uma relação mecânica entre uma coisa e outra. A criminalização das radiocom foi sempre uma arma discursiva usada pela Abert para desqualificar as radiocom, principalmente antes do surgimento da Lei 9612/98. Restringir o fenômeno das radiocom a uma questão meramente policial foi a estratégia usada durante muito tempo, e me parece também agora, para deslegitimar as demandas do movimento de rádios comunitárias. É claro que controle deve haver, até porque o dial não suporta a criação de emissoras para todos os interessados em montar uma rádio, mas esse controle deve ser técnico e administrativo e não policial.
IHU On-Line – A exigência pela regulamentação das emissoras de rádios locais fere os princípios da democracia?
Teresa Cristina Matos – Não acho que a simples existência de controle viole os princípios democráticos. O tipo de controle é que pode colocar em questão esses princípios. Toda a radiofonia no Brasil se submete a mecanismos de controle estabelecidos pelo Estado. Entretanto, esses não são iguais para rádios comerciais e comunitárias, por exemplo. Questões como o tipo de financiamento, o raio de cobertura e a impossibilidade de estabelecer rede entre rádios comunitárias são indicativos de diferenças que a meu ver vão ser revistas a médio e longo prazo, tornando mais democráticos os princípios de controle para os diferentes tipos de rádios.
IHU On-Line – Tendo em vista os grandes veículos midiáticos, qual é a função social das rádios comunitárias no Brasil? Em que medida elas podem contribuir para a democracia e para resgatar ou construir a auto-imagem de uma comunidade?
Teresa Cristina Matos – Uma das coisas mais interessantes que descobri na pesquisa foi o papel das rádios na vitalização do espaço público local. A vida da comunidade, do bairro passa a ser dinamizada. Esse mundo local, que pouco interessa as rádios comerciais, é a matéria-prima das radiocom. Os eventos, os problemas, as festas, as disputas ganham relevo nas ondas das radiocom. É um mundo menos homogêneo e mais rico que aparece. Nesse processo, a auto-imagem local ganha visibilidade e efervescência. É emocionante ouvir as pessoas falando sem receios de seus problemas, discutindo e encontrando soluções para as questões locais. Uma das rádios que pesquisei usou a estratégia de fazer uma parceria com uma grande rádio comercial para chamar a atenção para um problema de água e esgoto. A companhia responsável pelo serviço havia sido convidada para prestar esclarecimentos no programa da radiocom e ignorou o convite. Através da parceria com a rádio comercial, a companhia se viu obrigada a prestar os esclarecimentos. Acho que essas soluções e arranjos que tem ocorrido mostram as possibilidades das rádios comunitárias em relação ao fomento de um espaço público local ativo. Comparadas às rádios comerciais, as rádios comunitárias são um fenômeno recente, as conquistas são parte de uma história que está só começando. É certo que existem problemas, mas essa história é marcada por muitos e muitos ganhos para as comunidades em que se inserem.
IHU On-Line – Por que ainda há, na sua opinião, um limite na expansão das rádios comunitárias?
Teresa Cristina Matos – Como eu disse antes, não há espaço pra todo mundo no dial. Por conta disso há numérico um limite tanto para as rádios comerciais quanto para educativas e comunitárias. O que chama atenção é que as comunitárias são as que têm menos espaço. Um ou dois canais apenas para todas elas é de fato pouco. Mesmo que o argumento seja de que elas atuam em áreas específicas e não necessitam de um canal exclusivo, as diferenças entre o tamanho das e características das comunidades têm gerado problemas de sobreposição de estações e interferências. Acho que essa é também uma questão que a médio prazo precisará ser revista.

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Nota Pública da ABRAÇO Sudeste sobre o fechamento da Rádio Muda

A ABRAÇO, Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária - Regional Sudeste, vém a público externar sua indignação contra o fechamento arbitrário da Rádio Muda, ocorrida no último dia 19 de fevereiro de 2009, as 5: 30 hs da manhã dentro do Campus da Universidade estadual de Campinas, comandada pelo delegado Federal Dr. Heitor Barbieri Mozardo, Matrícula 17023, pelas razões que segue;1 - Estranha o fato do Sr. Delegado utilizar um mandado de Busca e apreensão antigo, datado de 21 de Junho de 2007, sendo que já existe decisão posterior da 1* vara Federal de Campinas, que entende que não se constitui crime a utilização e instação de equipamentos de Radiodifusão sem autorização. Esta decisão posterior, resultado de sentença proferida pela Juíza Dr. Márcia e Souza e Silva de Oliveira, da 1 Vara Federal de Campinas, no último dia 27 de Janeiro de 2009, cujo teor já é de conhecimento dos responsáveis pela ação, no caso o Delegado Heitor Barbieri Mozardo;2 - Mesmo se não houvesse posicionamanto anterior, houve flagrante ilegalidade do Delegado em realizar a busca e apreensão da emissora, pois no mandado foi observado que deveriam cumprir a cautela dos artigo 245 do Código de Processo Penal, que diz o seguinte " As buscas domiciliares serão executadas de dia, salvo se o morador consentir que se realizem à noite, e, antes de penetrarem na casa, os executores mostrarão e lerão o mandado ao morador, ou a quem o represente, intimando-o, em seguida, a abrir a porta" Ou seja, o mandado foi cumprindo fora do horário estipulado e sem que nenhum representante da emissora estivesse presente;3 - Sobre o fechamento de mais de 30 emissora na região de Campinas, A ABRAÇO vém a público informar que a Polícia federal vém sistematicamente tentando realizar o fechamento de emissoras comunitárias, cujos processos encontram-se instruídos e aguardando outorga do Ministério das Comunicações.4 - A Polícia Federal vém sistematicamente nas últimas semanas invadindo residências com mandados judiciais antigos para a realização de busca e apreensão em locais que não existem rádios comunitárias instaladas, fato já noticiado pela Abraço a imprensa de campinas.5 - As ações truculentas de agentes despreparados já causaram enormes prejuízos as pessoas vítimas de violência, como um representante de uma emissora agredido fisicamente pelo agente conhecido como Valente, na ocasião de fechamento de uma emisssora no ano passado, a omissão de socorro de vários agentes em outra ocasião, em decorrência da violenta ação policial contra uma senhora que teve uma metralhadora apontada e engatilhada sobre a sua cabeça, que passou mal e os agentes não prestaram o auxilio necessário, inclusive se negando a chamar o SAMU e uma ameaça do Agente conhecido como Fábio, que ameaçou um dos coordenadores da ABRAÇO dizendo que iria forjar um flagrante de ílícito para assim prendê-lo.6 - Lamentamos profundamente que a Polícia federal tenha tanta garra para prender militantes de um movimento social legítimo, organizado nacionalmente e que tenha como fundamental objetivo valorizar a cultura e a democracia em nosso país.7 - Como se fala em números, a maioria de origem duvidosa, desafiamos a Polícia Federal de Campinas a apresentar os números oficiais de operações de combate ao narcotráfico, lavangem de dinheiro, corrupção e principalmente a situação do assassinato do prefeito Toninho, cuja responsabilidade pelas investigações é da própria Polícia federal. 8 – A ABRAÇO também estranha que a Polícia Federal ainda não tenha executado ações de fechamentos das rádios comerciais irregulares que funcionam na cidade de Campinas, cujas outorgas encontram-se vencidas há vários anos, cuja denúncia encaminhamos ao Delegado Geral da polícia Federal de Campinas no mês de Janeiro. Será que a Polícia Federal age de Acordo com a frase “para os amigos tudo, para os inimigos a Lei”. A ABRAÇO, estará em comitiva a Brasília no Próximo dia 02 de Março, em reuniões na Corregedoria da Polícia Federal, na Comissão de Direitos Humanos da Câmara e na Presidência da República para encaminhar oficialmente as denúncias por nós ofertadas neste manifesto. Campinas, 20 de Fevereiro de 2009.
Sem mais,
Jerry de Oliveira
Coordenador Sudeste da Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária - ABRAÇO