terça-feira, 10 de janeiro de 2012

A luta pelo Conselho de Comunicação da Bahia


09/01/2012 |
Pedro Caribé
Observatório do Direito à Comunicação

No dia 10 de janeiro de 2012 ocorre a posse da primeira gestão do Conselho Estadual de Comunicação da Bahia. Até o momento restam muitas dúvidas sobre como foi construído e quais sãos os objetivos, por se tratar de algo incomum no país.

Na arena das Leis o Conselho está previsto no Art. 277 da Constituição Estadual de 1989 e terá como missão elaborar um Plano Estadual para o setor. A regulamentação teve origem em reivindicações de organizações sociais e academia, porém o caráter, atribuições e composição que deram forma ao Projeto de Lei foram desenhados conjuntamente por empresários, movimentos sociais e governo.

O fato de ter um caráter deliberativo dá ao Conselho esperança de vitalidade, ou seja, não se tornar mais um espaço que preza pela participação social, mas na prática se torna amorfo no aparato estatal. As atribuições podem atenuar problemas que se arrastam do século XX, a exemplo das fragilidades na radiodifusão pública e comunitária, acompanhar a violação aos direitos humanos e revisar o modelo distribuição das verbas publicitárias; bem como preparar o cidadão baiano para a sociedade da informação do século XXI, sob urgência de universalizar o acesso a internet em alta velocidade.

Estas potencialidades do poder executivo estadual, onde o Conselho está alocado, costumam ser subestimadas porque a Constituição Federal reserva maiores poderes a União ou Congresso Nacional, como as concessões de outorgas de radiodifusão e os contratos nos serviços de telecomunicações. Além disso, a desregulamentação ocorrida na década de 1990 privatizou associadas estaduais da Telebrás, haja vista a extinta Telebahia.

Contudo, neste país qualquer setor na sociedade tem o seu desenvolvimento fortemente regulado ou induzido pelo Estado, seja União, estados ou municípios. E mesmo sem ter pacto federal ou sistema de comunicação definido, é possível sim produzir políticas substantivas fora de Brasília. Mais ainda, a partir da Carta Magna de 1988 foi fincado na atuação do Estado mecanismos a fim de relevar a cidadania e o caráter público.

A instalação do Conselho é só o primeiro passo para suprir essa demanda participativa, a partir de agora é lutar para construir políticas realmente públicas que abarquem a produção, distribuição e acesso à comunicação enquanto direito. Tendo o Estado um papel que não agrida a necessidade de autonomia dos indivíduos e organizações nessa cadeia, e ao mesmo tempo incorpore lógica de desenvolvimento averso a concentração. Não será tarefa fácil, já que o Conselho é integrado por segmentos dotados, muitas vezes, de interesses distintos.

O percurso
Apesar do bônus e ônus do Conselho serem creditados majoritariamente ao governo, a proposta de regulamentação partiu de organizações sociais, acadêmicos e ativistas ainda em 2006, quando a equipe de transição do recém eleito Jaques Wagner recebeu uma carta de diretrizes para adotar políticas públicas de comunicação. Naquele momento, nem partidos, nem mesmo candidaturas no país tinham como alvo esta instalação ou mesmo um conjunto que indicasse mudanças de concepção nessas políticas.

No ano de 2008 foi realizada uma Conferência Estadual, na qual o Conselho e a criação da Secretaria de Comunicação (Secom) foram destacados. Porém esses encaminhamentos tinham lastro reduzido e por vezes subestimados. Após a realização da I Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), em 2009, se intensificou o panorama no país, incorporando setores empresariais mais pujantes e estabelecendo um debate público incomum na pauta, pois os aspectos da cidadania e concepção de políticas pública emergiram, mesmo sob forte oposição.

Pós-Confecom muitos ativistas em nível local ficaram sem plataforma para exigir dos representantes. No caso da Bahia a então subestimada Conferência se tornou espaço de incidência e articulação. A diferença é que os empresários também estavam integrando o processo, por isso, quando Jaques Wagner anunciou o Grupo de Trabalho (GT) para formular o Conselho, eles tiveram participação paritária, nos mesmos moldes da Confecom.

O GT realizou uma audiência pública e ao final chegou a uma proposta de consenso. Obviamente, ao final todas as partes envolvidas saíram ganhando e perdendo. Todavia, apareceu uma tempestade no meio do caminho. Durante as eleições de 2010 a Assembleia Legislativa do Ceará aprovou proposta de Conselho da deputado estadual Rachel Marques (PT). O fato foi distorcido por setores da imprensa para atacar o PT e consequentemente a candidatura de Dilma Rousseff, sob estigma de cerceamento das liberdades. A OAB e um Ministro do STF se colocaram contrários a proposta. Devido a pressão, o governador Cid Gomes (PSB) não a sancionou.

Ainda na tempestade, o ex-deputado estadual Carlos Gaban (DEM-BA) convocou uma audiência pública para debater a proposta no fim de 2010. O curioso é que nem mesmo os correligionários de Gaban apareceram para criticar o Conselho, mais ainda, os presentes foram majoritariamente favoráveis, inclusive a OAB-BA, após conversar com o governador Jaques Wagner sobre suas intenções.

A aprovação na Assembleia foi em conjunto com polêmico pacote de reforma administrativa em abril de 2011, o que acabou por não promover muitos debates sobre o Conselho. A novidade para o Conselho foi que repentinamente o governo resolveu transferir o Instituto de Radiodifusão Pública da Bahia (Irdeb) da Secretaria de Cultura para a Secom, e a confirmação de que a presidência do Conselho seria vitalícia do governo, o que não havia sido acordado no GT.

O Conselho de Comunicação ficou composto por 27 titulares e 27 suplentes. A sociedade civil detém 20 vagas de titulares reservadas entre empresários, organizações sociais, universidade e conselhos profissionais; outros setes titulares representam o governo. Os presentes são forças heterogêneas, mesmo internamente, por isso podem haver cisões camufladas ou mesmo expostas.

A última etapa foi a escolha dos membros. O receio do movimento social era de que o governo indicasse os membros sem devida eleição. Por isso, a necessidade de unidade das entidades se reconstituiu com mais força, e foi criada a Frente Baiana pelo Direito à Comunicação tendo como marco a realização de um seminário em julho de 2011. A Frente pleiteou que tivesse autonomia na indicação, e escolheu seus candidatos através de uma plenária em agosto com mais de 30 entidades.

Passavam os meses e o governo não convocava as eleições, até que em novembro foi publicado o edital. Em dezembro os membros foram eleitos, inclusive todos aqueles escolhidos pela Frente Baiana.

* jornalista, representante do Intervozes no Conselho Estadual. Mais informações no www.vozesbaianas.wordpress.com


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