quarta-feira, 24 de setembro de 2008

PL-29 institui o monopólio da rede e não convergência, diz Ministério das Comunicações

O parecer da consultoria jurídica do Ministério das Comunicações sobre o PL-29, divulgado na última segunda-feira (15), apontou que a convergência tecnológica (permissão para uma mesma empresa oferecer serviços de telefonia, internet e TV paga), sem uma legislação que obrigue os detentores das redes a alugar os seus meios de distribuição aos concorrentes, pavimentará o caminho para a monopolização do setor. Segundo o documento, a convergência deve se dar na oferta dos serviços e não no controle das redes.
A questão central proposta pelo PL-29 - projeto de autoria do deputado Paulo Bornhausen (DEM/SC) e relatado por Jorge Bittar (PT/RJ) - é esta: eliminar as barreiras legais, possibilitando que as empresas de telefonia estrangeiras sejam donas das mais diversas infra-estruturas de distribuição de conteúdo. Caso aprovado, o projeto permitiria, por exemplo, que a Telefónica – que já opera telefone fixo em São Paulo, oferece internet banda larga, é dona da Vivo, TIM, Telemig e Amazônia Celular e de uma rede de TV paga por microondas – também oficialize o seu domínio sobre a TVA, operadora de TV a cabo. O grupo espanhol já controla de fato a TVA, mas devido a lei do cabo, que impede grupos estrangeiros deterem mais de 49% das ações com direito a voto, esse domínio é exercido ilegalmente através da utilização do grupo Abril como laranja.
"Concentrações econômicas entre grupos ou empresas que atuem em diversas plataformas de distribuição de conteúdo podem ser lesivas à saúde do setor, haja visto o poder de mercado com a concentração também de infra-estruturas", afirma o parecer assinado pelo consultor jurídico do ministério, Marcelo Bechara.
Bechara alerta que a própria Lei Geral de Telecomunicações (LGT), em seu artigo 155, propõe a desagregação da rede como forma de gerar competição, sendo um exemplo a ser seguido pelas demais tecnologias de distribuição de conteúdo. "Para desenvolver a competição, as empresas prestadoras de serviços de telecomunicações de interesse coletivo deverão, nos casos e condições fixados pela Agência (Anatel), disponibilizar suas redes a outras prestadoras de serviços de telecomunicações de interesse coletivo", diz o trecho da LGT citado no texto.
Ainda no relatório, Bechara destaca que não há dúvida de que o "nome do jogo" chama-se internet banda larga. Este é o principal setor em disputa e o que atrai os usuários a contratarem os demais serviços ofertados pelas operadoras. Sobre este ponto, salienta o documento, "há um debate ganhando corpo no Brasil que é a banda larga pública. Isso porque a sua importância para todos os serviços e para a inclusão digital fez com que decisões e políticas públicas fossem pensadas e repensadas para sua disseminação. É uma prioridade não apenas de governo, mas de Estado", ressalta.
O parecer jurídico do ministério era aguardado há alguns meses. No entanto, ele só foi emitido agora, depois que o projeto teve a sua tramitação suspensa na Comissão de Ciência e Tecnologia para ser remetido à Comissão de Defesa do Consumidor, o que de certa maneira anula o substitutivo apresentado por Jorge Bittar e retoma o texto original aprovado na Comissão de Desenvolvimento Econômico, quando não existiam os artigos que estipulavam cotas para a produção nacional de audiovisual.
A análise produzida pelo Ministério das Comunicações abre um novo horizonte nos debates do PL-29. Ao mesmo tempo em que defende a proteção e o incentivo à produção nacional de audiovisual, sobretudo a independente, o documento também propõe medidas de estímulo à concorrência na distribuição de conteúdo, ao contrário do substitutivo até então debatido que buscava consolidar a desnacionalização da propriedade sobre as diversas redes físicas de distribuição.
Neste sentido, é salutar, na avaliação do MC, ter claro o que significa a convergência dos diversos serviços ofertados por uma mesma rede e o que representa a convergência econômica, "que é o processo de concentração oligopolista ou monopolista em que poucas empresas são capazes de ofertar uma gama de serviços".
"É fundamental que os canais de distribuição sejam ampliados em todas as plataformas tecnológicas como uma forma de desenvolvimento do setor. Com mais operadores e mais serviços ofertados, os preços tendem a cair, os acessos a crescer e os diversos conteúdos naturalmente encontrarão ambientes de veiculação", descreve o texto.
O relatório sublinha ainda que o PL-29 caminha num sentido contrário ao Plano Geral de Outorgas (PGO), onde está se buscando consolidar o desmembramento dos serviços. Um dos exemplos citados é a portabilidade, que permite ao usuário de telefonia trocar de operadora mantendo o seu número.
Sobre o conteúdo nacional, o ministério enfatiza que é necessário defender e privilegiar os setores de produção e programação de audiovisual, estendendo os incentivos para que os brasileiros ampliem o espaço ocupado não só na TV paga, mas igualmente em outros segmentos de mídia, assegurando a defesa dos interesses e da cultura nacionais.
Conselho Superior de Cinema
O parecer do Ministério das Comunicações também foi o destaque da reunião do Conselho Superior de Cinema, da qual participam representantes de nove ministérios, entre os quais da Casa Civil e das Comunicações.
O colegiado, que se reuniu na quarta-feira (17), ficou longe de construir um consenso do governo a favor do substitutivo, como almejava Jorge Bittar, que depositou suas fichas neste encontro para tentar aprovar o regime de urgência na tramitação do projeto na Câmara. O máximo que o deputado conseguiu foi a promessa de que um grupo de trabalho irá estudar o seu relatório com o objetivo de produzir um parecer a ser votado na próxima reunião, programada para o final de outubro ou início de novembro.
ALESSANDRO RODRIGUES

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